A magia teatral em cena | Crítica de “Céu Estrelado”

por Vendo Teatro
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Foto: Divulgação

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Por Cleyton Nóbrega
Recife, Janeiro 2020

“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo,
Perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto…

E conversamos toda a noite,
enquanto a Via-Láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: “Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?”

E eu vos direi: “Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e de entender estrelas”…
Olavo Bilac

A magia teatral em cena

Era um dia de sol reluzente, ao sair de casa, sentia o vento tocando meu rosto e balançando meus cabelos. Estava animado e ansioso em ir ao teatro naquele sábado tão bonito; chegando ao Recife Antigo, fui ao Teatro Apolo, pude ter uma experiência encantadora, regada de mensagens positivas e relevantes. Sendo parte da programação do 26º Janeiro de Grandes Espetáculos, a peça “Céu Estrelado”, do grupo Teatral Pedra Polida, é voltada para o público infantil, e dialoga sobre a relação dos seres humanos e a natureza, problematiza a relevância de nossas ações enquanto seres humanos e os impactos ambientais causados à natureza por todos nós.

O espetáculo possibilita não só às crianças, mas também todas as famílias, reflexão sobre que tipo de postura assumimos no dia a dia no desenrolar dos cuidados com o nosso planeta.  As enchentes que assolam boa parte do país servem como signo agenciador do espetáculo, e acarreta diversos desdobramentos no decorrer do espetáculo. De forma lúdica e criativa é possível aprender sobre coleta seletiva, efeito estufa e tantas outras temáticas. O espetáculo mergulha no universo infantil, enaltece a cultura nordestina por trazer referências de nossos folguedos populares, como Maracatu, Ciranda, dentre outros, e, também usa e abusa da metalinguagem e da arte circense.

Existe no desenrolar da peça a quebra da quarta parede e entre gargalhadas e olhares brilhantes de toda plateia, éramos surpreendidos a cada cena, o elenco tinha uma boa projeção vocal, era perceptível que o elenco do espetáculo entendia a intenção da fala dos diversos personagens que interpretavam, improvisavam; dessa maneira, incluíam no decorrer da encenação o público infantil que foi ao Teatro Apolo apreciar o espetáculo, eles convidavam as crianças a subir ao palco, inserindo-as na encenação, ou até mesmo iam até a platéia interagir com o público. Souberam aproveitar bem a espacialidade do palco, tudo isto unido a uma trilha sonora emocionante que em diversos momentos era partilhada entre os atores que faziam em determinadas cenas a sonoplastia do espetáculo, e, uma iluminação que nos ajudava a entrar na atmosfera da encenação dentre as diversas cenas do espetáculo.

Entretanto, é preciso que o grupo tenha um maior cuidado quanto a iluminação do espetáculo, pois em alguns momentos a iluminação estava bastante saturada e muito intensa, e em outros momentos o palco estava bem escuro, o que dificultava a visibilidade das cenas . A iluminação as vezes refletia sobre as extremidades do palco; e se espelhava no figurino de alguns dos atores do elenco (que tinha figurinos compostos por pequenos espelhos e lantejoulas), a luz recaía direto para a platéia na forma de vários feixes de luz, o que incomodava bastante a visão. E tinha um personagem em específico o ‘sol’ que alumiava ‘literalmente’ a visão de todos.

Existem três baús utilizados na cena, hora eles são casas, hora são barcos, o que me fez recordar um pouco do Peter Slade e o “Jogo Dramático Infantil,” preceito que fala sobre o poder da imaginação das crianças, e também de como a imaginação infantil está ligada aos processos de ressignificação dos objetos, onde um graveto através da brincadeira vira nave, carro, foguete…

De forma leve, divertida e encantadora o espetáculo nos presenteia uma proposta de encenação frutífera e reveladora de questões sociais e políticas que influenciam o bem viver de todos os habitantes do planeta terra. Faz refletir sobre que tipo de papeis e posturas assumimos no cuidado com o nosso planeta, e, com o outro; possibilita a todo o público reflexão, o expurgo de sentimentos, escancara o descaso do poder público para com as questões ambientais e ‘educa,’ através da reflexão e estimulo às subjetividades. Considero esses pontos elencados, muito positivos para todo o público infantil; que por relacionar-se com o teatro e sua pedagogia, acaba construindo familiaridade com suas subjetividades, criando um vínculo particular de apropriação e apreciação da cultura teatral.

Espetáculos como “Céu Estrelado” são necessários a cada dia dentro do cenário teatral pernambucano, tendo em vista, o teor extremamente mercadológico e alienado encontrado em diversas produções voltadas para o público infantil no estado, essa é uma estratégia que gera empregos, isso é fato, isso é bom leva o público infantil ao teatro, cria relações dele com a arte! Mas como se pode fazer e/ ou fomentar o teatro sem que exista o intuito da emancipação? Da mudança de perspectivas sobre a vida? Sobre o ser humano em dialogo com o mundo? Não perca a oportunidade de apreciar esse espetáculo, leve seus filhos, família e amigos, divirtam-se, aprendam. A magia teatral é encantadora e ‘necessária.’

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