Por Matheus Campos
Recife, Novembro de 2019
Breathtaking Aqui e Acolá
“E que seja doce tudo que tiver que ser…”
— Caio Fernando Abreu
Portas abertas, ingressos conferidos e atrizes e atores, já trajando seus figurinos, circulando pelo espaço. Tudo possui início às 20h do dia 08 de novembro de 2019 no teatro Arraial e o momento apoteótico e misterioso que cada peça, costumeiramente, possui é desmanchado pelo prazer de cumprimentar os atores na entrada e contemplar a paleta de cores do cenário previamente exibido.
Todos acomodados em seus lugares, luzes diminuem e avisos são dados. Rompendo o tradicional, dão-se as apresentações do elenco, dedicatórias e agradecimentos tomam o início do espetáculo que antes mesmo do início da dramaturgia, propriamente dita, já recebe salvas de palmas.
Por fim, a dramaturgia se inicia e logo de início o jogo no palco, desenvolvido pelo elenco, mostra suas primeiras facetas com os diferentes momentos vivenciados pelos atores. Ora narradores, ora personagens, ora somente corpos pelo espaço cênico.
O enredo da Trupe Ensaia Aqui e Acolá é inspirado num romance escrito em 1909 a 1912 A emparedada da Rua Nova do escritor pernambucano Carneiro Vilela. O Romance de Carneiro Vilela conta a tragédia gerada através do amor de Clotilde, emparedada viva pelo pai – Jaime Favais – por engravidar do galante Leandro Dantas.
Entretanto, quebrando todo o trágico presente na obra de Carneiro Vilela, a pernambucana trupe de teatro remonta a história, dando a ela um ar cômico e alterando os cursos das cenas até que se chegue num desfecho menos impactante e que atenda a nova proposta. Dessa forma chegando numa nova perspectiva dramático-narrativa.
A peça brinca com diferentes formas de representação dos objetos cênicos, partindo de representações icônicas – que denotam a forma e aspectos da coisa a ser representada – até representações cênicas subjetivas, que por meio da atuação e contexto dramático se infere do que se trata aquele objeto ou ação. Assim, despertando o máximo da capacidade lúdica dos espectadores que com olhos bem abertos e até infantis/brilhantes entravam na brincadeira/jogo teatral.
Além disso, o espetáculo explora uma paleta aberta de cores vivas e delicadas no cenário (Jorge de Paula), maquiagem (Trupe Ensaia Aqui e Acolá e Assessoria Ana Medeiros), iluminação (Sávio Uchoa) e figurino (Marcondes Lima), reafirmando os sentimentos de infância, de brincadeira.
Todo o ar do espetáculo é leve, é acolhedor como uma historinha contada enquanto nos balançamos numa rede. O aspecto coreografado de cada ação dos personagens fortalece cada vez mais o universo do imaginário e do cômico, e para deixar todo o espetáculo redondo, fechando a ideia de imaginário, a peça se apresenta como um musical.
Não simplesmente um musical, mas um lip sync-musical . Pois, além de apresentar características de um musical – música como elemento participativo e coesivo na narração da peça – o espetáculo traz as músicas dubladas e coreografadas de uma forma única e cômica. Valendo fazer um adendo de que as músicas presentes no espetáculo fazem referência à cultura pop nacional e internacional, trazendo à tona interpretações de canções como Endless Love e The Time Of My Life.
Como uma grandessíssima brincadeira de roda, o espetáculo começa e como uma grandessíssima ausência de fôlego, após a brincadeira de roda, o espetáculo termina. Olhos brilhantes, sorrisos eufóricos e palmas incansáveis, a platéia que começou repleta de adultos se desfez e crianças assumiram seus lugares. Delicadamente as aproximadas 1h30min de espetáculo passaram-se como numa agradável soneca da tarde.