Quem imaginaria que um capitão faria tanto estrago? | Crítica de Ubu Rei ou a Revolta dos Coadjuvantes

por Vendo Teatro
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Foto: Juliabe Balbino

Por Ananda Neres
Revisão Crítica: Luiz Diego Garcia
Recife, Outubro de 2021

Era uma vez um lugar no qual o líder sofreu um golpe de estado dado por um capitão. Este militar assume o poder e é responsável direto pela morte de milhares de pessoas deste lugar. Não bastasse, busca impor impostos cada vez mais altos e uma condição de vida miserável à população, que toma como inimiga.

Talvez você tenha imaginado que falo do Brasil de 2021, mas falo de Alíquota, país fictício no qual se desenrolam os acontecimentos de Ubu Rei ou a revolta dos coadjuvantes, espetáculo do Teatro Bissexto. Com temporada financiada pelo FUNCULTURA, o Teatro Bissexto (com direção de Carlos Lima) apresentou uma adaptação do texto de Alfred Jerry de sexta a domingo durante as três últimas semanas de outubro. A sessão virtual é realizada ao vivo e apresentada simultaneamente nas plataformas Zoom Meetings e Youtube, aumentando a acessibilidade ao espetáculo. 

Ainda em contexto pandêmico, os atores estão cada um em sua janela, cada um em sua casa. Fato que não impede que as personagens estejam no mesmo ambiente. Para isso, há uma preocupação em simular o mesmo local nas diferentes telas a partir do uso de iluminações análogas ou do mesmo fundo de tela, o que dá coerência às imagens apresentadas. Além disso, ao nomearem as telas, utilizam esse recurso para brincar com os nomes das personagens, tudo muito divertido.

Utilizando-se da bufonaria, as personagens ao exagerarem, satirizarem e parodiarem as situações e a si próprios revelam mazelas sociais e relacionam-se diretamente com a política nacional brasileira. São exemplos disso, referências ao absurdo powerpoint de Deltan Dallagnol, parte do processo que culminou no golpe eleitoral de 2018; às lives grotescas do excelentíssimo presidente da república ou mesmo às Leis de Incentivo. Não resumindo-se a esses aspectos, o exagero ainda está presente, como esperado, nos corpos dessas figuras. Os figurinos, assinados por Fábio Caio, são visualmente impressionantes, construídos aparentemente de espuma, eles hiperbolizam os órgãos genitais seja pelo excesso ou pela falta e constroem uma camada a mais nas personagens, mesmo que o corpo nunca seja o foco.

A história dos golpes acontecidos em Alíquota é contada através de depoimentos das personagens, quase como relatos policialescos com voz alterada ou mesmo documentários. A construção do espetáculo ocorre por meio de cenas curtas em sequência, o que dá um aspecto fragmentado à apresentação. Além disso, a apresentação realiza-se em breves 35 minutos. A sensação ao fim é que não vimos o suficiente dessas figuras tão particulares.

De forma leve e despretensiosa, o Teatro Bissexto diverte ao passo que critica, aponta aquilo que nos recusamos a ver. Afinal, rir é uma arma poderosa, rir de si e da própria desgraça mais ainda. Satirizar a miséria na qual nos encontramos é uma forma de entender e modificar a realidade. 

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Anónimo
2 anos atrás

O Teatro Bissexto é muito bonito, com atores muito talentosos

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